Saúde mental em tempo de Covid
Abril 05, 2021
Maria Coisa Nenhuma
Desde a minha infância que ando de candeias às avessas com a minha saúde mental.
Aos 4 anos comecei a sentir os efeitos de uma perturbação obsessivo compulsiva por higiene, limpeza, repulsa a todos os insetos e bichos estranhos desta vida e uma necessidade extrema de manter o meu espaço seguro e protegido. Perturbação essa que me acompanha até hoje. Aos 13 anos tive o meu primeiro ataque de pânico, e como a ansiedade foi crescendo e dominando a minha vida, os ataques de pânico passaram a ser uma constante. Muitas são as vezes em que acordo durante o sono com dificuldade em respirar e o coração quase a saltar do peito, sem saber se morro ou se desmaio.
Ora já não bastava as dificuldades do dia a dia, teve que vir o Covid sobrecarregar ainda mais este fardo. Primeiro chegou e causou logo uma valente ansiedade! O que é? Como se manifesta? É contagioso tipo como, de que forma, porquê? Como o posso evitar? Esperem aí, posso morrer??? O medo do desconhecido é real. Mas o problema é que quanto mais sabemos do Covid, mais medo o desgraçado nos dá. Ora como é que uma pessoa não há de ficar de nervos em franja?
Já para não falar do confinamento, para muitas pessoas foi um suplício autêntico. Apesar de necessário e por um bem maior, o confinamento e tudo o que este acarreta, trouxe ao de cima as fragilidades, o medo, as inseguranças, a dor, a solidão. Felizmente foi disponibilizado pelas ARS a possibilidade de apoio psicológico a quem o solicitasse, mas acho que há ainda espaço para mais ajudas. E são bem vindas!
Relativamente à logística da limpeza, desinfeção de espaços e superfícies e higiene, já entramos na minha área. Ora eu já sou fã de lixívia e álcool há algum tempo, portanto a limpeza e desinfeção da casa não sofreu qualquer alteração. A roupa também já lavava frequentemente a temperatura superior a 40°c. Já retirava das embalagens de cartão as compras e limpava com um pano húmido com vinagre de limpeza as restantes que se mantinham na embalagem original. A loiça era lavada a altas temperaturas também. Lavava as mãos com frequência e quando não era possível tinha álcool gel na carteira para o efeito. Já desinfetava o telemóvel diariamente também. Portanto neste campo, pouco ou nada alterei.
Quando em Março do ano passado se falou da necessidade de utilizar máscara para prevenir o contágio, não hesitei. Comecei logo a usar sempre que precisava sair de casa. Comprei uma embalagem considerável de álcool gel na farmácia e passou a ser o meu melhor amigo! Sempre que tenho que estar nalgum sítio em que estejam mais pessoas, deixo sempre toda uma distância de segurança (talvez 2x mais que a recomendada, só para garantir). Confesso que cheguei a ir algumas vezes ao supermercado ou até aos CTT de luvas, mas sabia lá eu, mais valia prevenir do que remediar.
Quando muitas pessoas se estavam a tentar adaptar a esta mudança de procedimentos e realidade, eu estava mais tranquila porque na verdade já fazia parte do meu dia a dia. Lembro-me de achar que finalmente todas as pessoas iam compreender as dificuldades de quem tem uma compulsão por limpeza e higiene já que estávamos todos no mesmo barco.
Mas depois refleti melhor e infelizmente compreendi que toda esta situação está apenas a exacerbar os meus comportamentos. Quando isto tudo acabar e voltarmos à normalidade, a necessidade de limpeza e desinfeção volta ao nível anterior para grande parte das pessoas, mas a minha obsessão vai manter-se. Neste momento sei que não é em demasia dada a conjuntura atual, mas mais tarde continuará a ser um problema. Apenas está camuflado agora.
O impacto que o Covid, e todos os seus derivados, tem em nós pode ser grave. Podemos precisar de ajuda para conseguir lidar, para conseguir ultrapassar, para nos mantermos à tona quando muitas vezes nos sentimos a ser puxados para baixo.
Não somos obrigados a estar sempre bem, não tem mal se não estivermos. O importante é que percebamos em que ponto estamos, o que sentimos e saibamos pedir ajuda. Às vezes por mais força de vontade que tenhamos, não é suficiente. Admitir que precisamos de ajuda não é um ato de fraqueza mas sim de coragem.
Durante anos evitei a psicoterapia por não ter a certeza do seu benefício, de como me ajudaria e também porque não queria ajuda. Tinha quase a certeza de que sozinha conseguia controlar tudo. Mas estava totalmente enganada e estou feliz por ter aceitado esta ajuda.
Mais do que tratar os sintomas, é importante identificar a causa dos nossos problemas. Isto é o que a psicoterapia tem feito por mim. É bom quando podemos expor sem julgamentos tudo o que sentimos e pensamos e do outro lado existe alguém disposto a ajudar-nos e a mostrar-nos que a vida é de fato preciosa e efémera e precisamos vivê-la sem amarras, sem sofrimento, apenas aproveitar tudo o que ela nos tem para oferecer.
Vivamos!